Segundo pesquisa do MEC, apenas 4 em cada 10 crianças do 2º ano do ensino fundamental conseguem ler e escrever na idade certa
O estudo Alfabetiza Brasil do Ministério da Educação (MEC) divulgado na última quarta-feira (31) apontou que 56,4% das crianças brasileiras não estavam alfabetizadas no 2º ano do ensino fundamental em 2021.
Para chegar a esse índice, a pesquisa considerou como alfabetização a capacidade de ler pequenos textos formados por períodos curtos, localizar informações na superfície textual e a capacidade de realizar inferências básicas sobre textos que combinam linguagem verbal e não verbal.
Em relação à escrita, os critérios foram a capacidade de produzir texto a partir de uma demanda relacionada ao contexto da vida cotidiana e ao cumprimento da intenção comunicativa com relativa eficácia, mesmo que existam desvios da norma padrão)
Especialistas, como a diretora de projetos da Frente de Alfabetização, Daniela Caldeirinha, destacam que a defasagem escolar impacta na vida dos estudantes, ao promover o aumento de distorções idade-série, perda de interesse pela escola, evasão e reforço de desigualdades e exclusões educacionais e socioeconômicas.
As consequências se estendem pela vida adulta: de acordo com artigo do pesquisador Ricardo Paes de Barros, um indivíduo alfabetizado alcança um índice de 77% em uma escala de qualidade de vida, enquanto um não alfabetizado chega a somente 43%.
Professores e professoras esquecidos
Diante dos impactos negativos que a formação tardia traz para alunos/as e para o país, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou que reverter esse cenário é uma das prioridades do governo federal e apontou que em breve lançará um grande pacto nacional pela alfabetização das crianças na idade certa.
Segundo ele, o MEC precisa definir indicadores para ter um ponto de partida e ressaltou a necessidade da colaboração das lideranças estaduais e municipais para definir políticas públicas, visão compartilhada pelo presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo.
Para o dirigente, qualquer modelo que ignore o cenário com o qual os professores/as convivem não atingirá o objetivo e será necessário atuar em várias frentes a começar pela formação dos educadores/as.
“Muitos foram preparados em faculdades privadas que dizem ter professores com mestrado e doutorado, mas que não atuam e não conhecem a realidade da sala de aula. Além disso, observamos um excesso de docentes formados por um modelo de educação à distância, quase 70% deles concluíram os estudos assim nos últimos 10 anos. Sem saber o que se passa numa escola, sem troca direta de experiência e sem um foco adequado para a alfabetização”, alerta.
Política continuada
Além disso, diz Heleno, o governo federal precisa enviar um projeto ao Congresso para aprovar a lei do Sistema Nacional de Educação, responsável por definir a participação da União, estados e municípios no processo de ensino e permitir aos gestores municipais a realização de concurso.
“Muitos trabalhadores/as da educação são contratados em formato temporário, burlando a Constituição Federal, para um cargo que não é de professor, como forma de não cumprir a lei do Piso do Magistério e impedir o direito a um plano de cargos e carreiras. Lembramos também que, desde 2015, o PNE (Plano Nacional de Educação) diz que teria uma política continuada para nós e, até hoje, isso não foi colocado em prática”, critica.
Salas inadequadas
Aliado a esses fatores, docentes, alunos e alunas ainda enfrentam a falta de condições estruturais adequadas. Segundo fiscalização realizada neste ano por 32 tribunais de Contas, 57% das salas de aula visitas em todo o país são inadequadas como local de estudo.
Portanto, segundo o dirigente, qualquer política eficaz de alfabetização começa por abrir espaço à participação de quem está nas escolas na construção de qualquer modelo.
“Nas falas do MEC, do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) ou dos aplicadores da pesquisa, não vemos citação à infraestrutura das escolas, ao quadro de pessoal, se o município realiza concurso público com formação de nível superior para alfabetizadoras/es, de acordo com a Constituição.. Os governos anteriores do presidente Lula já definiram parâmetros de qualidade para educação infantil que determinam qual a infraestrutura específica para creche, para pré-escola de 4 a 5 anos e para os anos iniciais do ensino fundamental. O que falta é cumprir”, afirma.