Retomar a gestão democrática, reestruturar órgãos de educação do governo e aumentar investimentos no setor são formas de contornar as dificuldades no cumprimento das metas do novo Plano Nacional de Educação (PNE). A conclusão é dos participantes da audiência pública virtual interativa realizada nesta segunda-feira (10) pela Comissão de Educação (CE) .
Foi o oitavo e último debate do ciclo de audiências requerido pelo senador Flávio Arns (PSB-PR) para discutir o novo PNE. O senador, que presidiu a audiência, espera nortear a elaboração do documento para o decênio de 2024 a 2034. Para Arns, o Senado também pode influenciar o plano ao alterar o atual PNE, ainda que esteja no último ano de vigência.
— Essa é a última [audiência] desta primeira série, porque o [Poder] Executivo deve enviar ao Congresso Nacional no segundo semestre a proposta do novo PNE. Essas audiências subsidiarão as propostas. Estamos aprovando projetos de lei que alteram o PNE em vigência, apesar de estarmos no último ano, para que o aspecto aprovado eventualmente possa trazer luz e foco na elaboração do novo plano — disse Arns.
Investimentos
O reitor do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), Rafael Barreto Almada, criticou os impactos na educação trazidos pela Emenda Constitucional 95, que instituiu o teto de gastos. Para Barreto, a regra fiscal levou ao descumprimento de diversas metas. O reitor do IFRJ também cobrou maior participação de conselhos de regulação de profissões nas discussões do novo PNE.
— A gente sabe dos desafios desses dez anos: redução dos investimentos na área da educação, a emenda constitucional do teto do gasto… A gente no Rio de Janeiro tinha meta de chegar a 23 mil estudantes, e não conseguiu, por causa de [falta de] investimento — disse Barreto.
A senadora Zenaide Maia (PSD-RN) criticou o teto fiscal instituído em 2016 e sugeriu alterar a maneira como o Estado paga a dívida pública, para beneficiar a educação.
— O Orçamento do nosso país é composto por uma ‘caixa de pandora’. Basta se debruçar e ver: a décima economia [do mundo] entrega quase 50% do Orçamento para serviço de juros de uma dívida que nunca foi nem auditada. Aí ficamos nós, no Congresso Nacional, mendigando, com 4% deste Orçamento para a educação, 4% para a saúde e menos de 0,5% para a segurança pública. Devemos focar na Comissão Mista de Orçamento. [Orçamento p[ublico] é uma decisão política e o Congresso pode, sim, decidir politicamente: ‘Bancos, por favor, não vamos lhe dar metade do nosso orçamento. Vamos pagar aqui 30% e deixar esse 20% para a gente investir em saúde e educação’ — afirmou Zenaide, utilizando o Japão e os Estados Unidos como exemplo de investimentos e pagamento da dívida pública.
Sistema Nacional de Educação
O representante da Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (Proifes-Federação), Carlos Alberto Marques, cobrou a aprovação de um sistema nacional de educação para garantir o cumprimento do novo PNE. O sistema, previsto na Constituição e no atual PNE, atuaria na articulação entre entes federados e instituições públicas e privadas de educação. Para Marques, o sistema ajudaria a identificar agentes privados em descumprimento com suas responsabilidades, que poderiam ser desabilitados.
— É um problema maior que a formação dos jovens esteja sendo feita sob ótica de valores privados no âmbito da competição permanente, de um sujeito empresário, muitas vezes frio e que só pensa em lucro. A educação deve ter caráter público, formar o sujeito para a vida pública, social e pacífica. É preciso que agentes privados tenham deveres muito claros. O PNE só será efetivo por meio de um eficiente sistema de avaliação, funções características de um sistema nacional de educação. Não temos um sistema aprovado. [Mas] temos uma proposta aprovada no Senado, de autoria do senador Arns — disse Marques, se referindo ao Projeto de Lei Complementar (PLP) 235/2019, que cria esse sistema nacional de educação, aprovado em 2022 no Senado e em análise na Câmara dos Deputados.
Participação social
Segundo o diretor da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae), Luiz Fernandes Dourado, o Brasil vive um momento positivo de reestruturação da educação. Para Dourado, o país já discute planos nacionais de educação desde os anos 30 que nunca tiveram continuidade e o mesmo ocorreu com o plano vigente.
— Quando [o atual PNE] foi aprovado, expressou grande pacto federativo e democrático de educação. [Mas na execução do PNE] o Ministério da Educação [MEC] teve atuação bem restrita. O Fórum Nacional de Educação foi objeto de intervenção unilateral do MEC, só recomposto agora no cenário atual. Esse histórico é fundamental para identificar que houve estrangulamento no PNE após o golpe [referindo-se ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016]. O novo PNE deve garantir que façam valer a condição constitucional: que seja resultante de ampla participação — disse Dourado.
Também participaram por videoconferência a presidente da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope), Suzane da Rocha Vieira Gonçalves; a representante da Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo (Sedu-ES), Cinthya Campos de Oliveira Mascena; a integrante da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), Miriam Fábia Alves; e o integrante do Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil (Mieib), Bruno Tovar Falciano.
PNE
O PNE é um plano estabelecido por lei que abrange o período de dez anos e determina diretrizes, metas e estratégias para a política educacional. São levados em consideração todos os níveis da educação, do ensino infantil ao superior. Instituído pela Constituição, o plano baliza os estados e municípios na elaboração de seus respectivos documentos, chamados planos subnacionais. A integração dos entes federativos na área é prevista não só na Carta Magna, mas também na Lei 9.394, de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação — LDB).
Fonte: Agência Senado